23 maio, 2010

A queda da stôra Bruna

José Diogo Quintela, Pública

Quando eu andei na escola, há 20 anos, se quisesse ver uma professora toda nua, tinha de usar a imaginação. Imaginava, por exemplo, que estávamos no meio de uma aula de Inglês, a conjugar o verbo to redeploy e, de repente, tocava o alarme de incêndio. A escola estava a arder! Não conseguíamos sair da sala porque o corredor estava cheio de fumo, nem saltar, porque era um 3.º andar. O calor ia aumentando, até se tornar insuportável e termos todos de nos despir. Quando os bombeiros finalmente nos salvavam, a professora já estava em pelota. Era uma fantasia duplamente reconfortante: não só conseguia ver a professora toda descascada, como, ainda por cima, não tinha aulas até ao fim do ano, porque a escola estava reduzida a cinzas. Claro que não era sempre a mesma fantasia: às vezes passava-se durante a aula de Geografia, a meio de uma lengalenga sobre afluentes do Tejo, e era um ciclone que fazia voar o telhado, as paredes e a roupa da stôra.

Estas efabulações ocorriam-nos com alguma frequência. Há 20 anos, quando um aluno dizia que gostava de ver a professora como tinha vindo ao mundo, queria mesmo dizer que era sem roupa. Não é como agora, em que significa que gostava de a ver a levar palmadas até chorar.

Portanto, a natural paixoneta pela professora estimulava a criatividade dos alunos. Queriam ver a professora nua? Então meditassem a sério sobre isso. Hoje já não é preciso. É só facilidades, dado que as professoras aparecem na Playboy. Os putos não precisam de puxar pela cabeça, basta-lhes puxar pela carteira e pagar os 4 euros da revista. Têm a papinha toda feita. No caso da stôra Bruna, mesmo muito bem feita.

Entretanto, a stôra Bruna foi afastada das suas funções e colocada no Arquivo Municipal de Mirandela. Por um lado, não faz muito sentido. Numa altura em que abundam as queixas de professores que são maltratados pelos alunos, esta escola resolve afastar uma das poucas professoras em quem os alunos não só não querem bater, como até desejam dar festinhas. Por outro, compreende-se a atitude da Câmara Municipal de Mirandela. Mandar a stôra Bruna para o Arquivo Municipal parece-me bem jogado por parte da autarquia. Um Arquivo Municipal não deixa de ser uma biblioteca e esta transferência pode incentivar muitos jovens a dedicarem-se mais à leitura. Tudo bem que é maioritariamente a leitura de documentos administrativos, relativos à elevação de Mirandela a cidade ou a disposições legais sobre taxas de esgotos, mas quem garante que um rapaz que comece por levantar o Inventário de 1987 - 1.º Semestre, não possa mais tarde querer ler O Primo Basílio?

No espaço de um ano, esta é a segunda vez que uma docente com um dom artístico é despromovida. A primeira foi quando Isabel Alçada foi convidada para o Governo. Tal como Bruna, uma pedagoga-artista que desceu na vida.

Por falar em Isabel Alçada, estou muito curioso para ler o próximo livro de Uma Aventura... Será que a sua experiência à frente do Ministério da Educação a levou a mudar alguma coisa na caracterização das personagens? Será que as gémeas agora acham que os professores são preguiçosos que não querem ser avaliados? Será que Faial, o feroz pastor alemão, e Caracol, o simpático mas aguerrido caniche, rosnam quando cheiram um sindicalista da Fenprof? São tudo questões que deixo para os alunos da stôra Bruna responderem. Uma vez que, na posse da vossa cópia da Playboy, já não têm a cabeça ocupada a fantasiar, usem-na para me ajudar, se fazem favor.

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