Daniel Sampaio, na Pública
Num recente debate televisivo sobre o casamento entre pessoas do mesmo sexo, foi argumentado que esta alteração legislativa seria "contra a família". Em muitos artigos de opinião, partilha-se esta ideia e crescem os contributos na defesa dessa instituição "civilizacional", a família composta por um casal heterossexual e respectivos filhos.
Não esqueço que esse é o modelo predominante no nosso país, nem ignoro o facto de termos sido educados em seu redor. Compreendo até que se diga como esta estrutura é fundamental e por isso deva ser defendida. Tenho, no entanto, mais dificuldade em admitir as críticas aos modelos organizativos diferentes da família nuclear intacta, como se daí viesse logo mal ao mundo.
O discurso sobre a família está cheio de pressupostos ideológicos. De um lado, os "familialistas", nome por que designo os defensores acérrimos de que a virtude está só nos agregados familiares "tradicionais", com casais intactos e filhos de ambos, todos a viver sob o mesmo tecto. No extremo oposto do fundamentalismo, todos aqueles que consideram a família qualquer coisa de retrógrado e em vias de extinção, porque o que existiria agora seriam uniões voláteis sem definição prévia.
Para mim, faz todo o sentido falar de famílias (no plural) e procurar uma definição que englobe as novas organizações familiares, ao mesmo tempo que defendo a promoção de políticas flexíveis que respeitem essa diversidade. É assim que tento definir família(s) como um espaço emocional com práticas familiares (guarda, sustento, apoio, educação, afectividade, valores...), sem limites rígidos de residência, casamento ou orientação sexual dos cônjuges, no qual sobressai a preocupação com o cuidar dos seus membros. Nesta divisão englobo a família nuclear "tradicional", a família monoparental, os agregados familiares reconstituídos, os casais do mesmo sexo com ou sem crianças, os casais living aparttogether com ou sem filhos a seu cargo e muitos outros modelos de vida gregária existentes ou que o futuro definirá.
Nada me impressiona nesta diversidade de estruturas, se tiver a certeza de que a preocupação com o cuidar está no topo das preocupações; e se a ética no relacionamento for o valor fundamental a preservar em todos os momentos. Os progenitores de uma determinada criança podem viver em diferentes casas, mas partilharem as responsabilidades educativas em relação aos filhos de ambos. Um pai "afectivo" pode estar mais tempo junto de um jovem, mas a presença ocasional do pai biológico pode ser enriquecedora para o adolescente, desde que uma avaliação criteriosa a considere pertinente. A verdade é que a fragilidade do elo conjugal e o consequente aumento dos divórcios provocou uma nova reflexão sobre a família, prevalecendo hoje a ideia de que deve haver uma autoridade parental partilhada e relações constantes, em vez da escolha de um progenitor em detrimento de outro.
Deveremos centrar a nossa atenção na procura da estabilidade e no reconhecimento da ética de cuidar que caracteriza alguns dos modelos organizativos da família actual, sem criticarmos a sua existência ou sem à partida os considerarmos disfuncionais. Infelizmente, muitos técnicos da área psicossocial depressa desqualificam os novos modelos familiares porque estão condicionados por modelos "clássicos" de família que não correspondem ao que encontram no terreno; e muitos juristas vão no mesmo sentido, ao não reconhecerem que mais do que um adulto pode ter uma conexão legal com a criança (pai "biológico" + pai "afectivo", por exemplo).
Não avançaremos no apoio às crianças se partirmos do pressuposto de que elas só serão bem cuidadas em atmosferas familiares "tradicionais". Outros modelos podem ser competentes, ter recursos e cumprirem as responsabilidades parentais
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