Vasco Pulido Valente, Público
Há anos que ouço os políticos condenarem o pessimismo nacional. Quando as coisas não correm bem, todos se queixam da influência dos "velhos do Restelo" (sem perceber, evidentemente, o que representa o "velho do Restelo"). É como se o entusiasmo, a fé, ou a inconsciência de meia dúzia de pessoas, que se podem fazer ouvir, mudasse o mundo. Isto dantes ficava reduzido a menos de meia dúzia de "comentadores", que o governo não gostava de ouvir. Cavaco inaugurou o muro das lamentações. Mas foi seguido por Guterres, por Barroso, por Santana e agora por Sócrates, que se proclama um "resistente" (à crise, evidentemente) e acusa a oposição de "se resignar". Só que hoje os "comentadores" não são o único problema. Nem se quer o maior.
Gente da direita e da esquerda, com prestígio e, o que é pior, com autoridade, fala do país como falavam antigamente os "comentadores". E o número de "velhos do Restelo" aumenta dia a dia. Claro que, desde o princípio, Sócrates transformou a política numa comédia de enganos, que já não engana ninguém; e que as circunstâncias não encorajam a credulidade do cidadão comum. Ainda por cima, não existe maneira de atribuir a longa estagnação da economia portuguesa, o défice do Estado, a dívida externa e o afastamento da "Europa" ao carácter depressivo e malévolo de uns tantos "descontentes". No Restelo, estão agora economistas com números e bastam esses números para justificar as profecias mais lúgubres. Parece que, afinal, os pessimistas tinham razão.
Numa semana (e falta ouvir Medina Carreira), Silva Lopes, Ernâni Lopes, Campos e Cunha e Bagão Félix mostraram bem como o desânimo se tornou irreversível. Ernâni Lopes resumiu o sentimento geral. "Esta década", disse ele, "é uma década sem garra, sem ideias, sem verdade, sem força, sem lucidez, sem substância... (É) uma década de incapacidade na visão estratégica e de fantasia na leitura da realidade económico-financeira... (É uma década de um) permanente esforço exibicionista sem conteúdo e uma expressão sem nobreza... Nunca vi nada assim." Convém lembrar que, nesta década (de facto, quase década e meia), governaram Portugal Guterres, Barroso, Santana e Sócrates. No total, 11 anos de PS, três de PSD. E Sócrates continua.