Vasco Pulido Valente, Público
No meio desta melancólica trapalhada, o eng.º José Sócrates não explicou ainda - com princípio meio e fim - qual é a sua política financeira. Onde vai pôr e onde vai tirar. Em que exacta situação fica cada português, por quanto tempo, com que resultados. Dia a dia, o Governo anuncia medidas, neste ou naquele ministério, por esta ou por aquela razão, de que não se percebem claramente nem o alcance, nem as consequências. Não há um quadro completo e lógico, que permita ao cidadão comum ir percebendo o que se passa. Há, ou pelo menos parece que há, uma espécie de pânico e uma actividade improvisada e aleatória, nem sempre clara e coerente. Dá a impressão de que o eng.º Sócrates já não sabe onde está e não tem a menor ideia do que deve fazer para aliviar um pouco a desordem das coisas.
Terça-feira, com a sua sabedoria, o dr. Mário Soares pediu ao primeiro-ministro que fosse à televisão, sozinho, esclarecer e orientar o país, que anda claramente inseguro e perplexo. Ele, como é óbvio, não foi. Não lhe entrou com certeza na cabeça que perdeu a confiança de toda a gente. E, no entanto, basta ler os jornais para se verificar a solidão do homem. Em quarenta anos de política, nunca assisti a um desprezo tão constante, a uma hostilidade tão brutal, a uma unanimidade crítica tão completa. Qualquer pessoa de senso e dignidade tirava as conclusões da situação e desaparecia logo. Sócrates, não. Sócrates resiste, acha ele, a bem da Pátria em perigo. É uma ilusão comum e é também uma ilusão perigosa. O menor incidente pode hoje sem dificuldade acabar com ele. E, de caminho, connosco.
Mais do que nunca Portugal precisa de um primeiro-ministro grave, respeitado, discreto e, principalmente, livre do mais leve sarilho pessoal. A Constituição não impede que Sócrates seja substituído, sem eleições, por outro socialista (de preferência deputado) que o partido escolha: Jaime Gama, por exemplo. Não acredito que a posição financeira de Portugal sofresse com isso. Pelo contrário: a fraqueza e a fragilidade deste Governo não são uma garantia para ninguém. Claro que a troca prejudicava Passos Coelho e Paulo Portas, como de resto, em certa medida, o Bloco e o PC. E que Sócrates simplifica a vida a Cavaco. Mas Portugal ganhava com a remoção de um centro de acrimónia e conflito e com o restabelecimento de uma normalidade, mesmo cautelosa e temporária.
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