Rui Tavares, Público
Um dia Rui Pedro Soares será apenas um nome que ligaremos a um escândalo político que já lá vai. Pouco antes de desaparecer na obscuridade, porém, decidiu fazer declarações em que comparava a comissão parlamentar de inquérito ao caso PT/TVI aos "tribunais da Inquisição".
Rui Pedro Soares talvez não entenda que, enquanto este for lembrado, o seu nome será para os portugueses (incluindo, não pense ele outra coisa, aqueles que votam no seu partido) o emblema da mediocridade e da arrogância que chega ao poder e ao privilégio por intermédio de favorecimentos e favoritismos, que exerce esse poder da forma mais gabarolas e irresponsável, tendo como único objetivo satisfazer o mando do político que o pôs naquele lugar, e que para desempenhar tal tarefa é pago num ano muito mais do que muitos portugueses esforçados e honestos ganham trabalhando a vida toda.
Por gente como ele, Ricardo Rodrigues, e outros, se falará um dia de "tralha socrática".
Para a maioria dos portugueses (incluindo os do PS) Rui Pedro Soares não passou nunca de uma espécie de capanga de luxo, encarregado de despachar os trabalhinhos sujos dos outros. Para lá disso, a sua atitude só surpreendia pela desfaçatez e descaramento. E agora juntou-lhe uma ignorância gritante e ofensiva.
Vamos recapitular brevemente as principais diferenças entre um tribunal da Santíssima Inquisição e uma Comissão Parlamentar de Inquérito.
Num tribunal da Inquisição, Rui Pedro Soares poderia ser preso por denúncias anónimas ou meros rumores. Uma vez preso, ficaria nas masmorras até que os seus juízes se dessem por satisfeitos com as suas declarações. Ficar em silêncio não seria, evidentemente, um opção. Rui Pedro Soares seria provavelmente torturado para falar. O tribunal teria então de determinar se ele estava ou não arrependido e, para tal, agradeceria se ele pudesse denunciar mais três ou quatro pessoas. Depois de um tempo de prisão indeterminado, Rui Pedro Soares poderia ser sujeito a castigos corporais ou à pena de morte.
Tenha-se ainda em conta que o Tribunal da Inquisição (ou tribunais, por eram vários) tinham uma rede de milhares de espiões pelo país todo (os "familiares") e que, além de um tribunal religioso era também uma agência étnica/racial que pôs durante um par de séculos milhares de portugueses a elaborarem certidões para provarem que não tinham antepassados judeus (as "habilitações de limpeza de sangue e geração").
Agora a Comissão Parlamentar de Inquérito, vulgo CPI. Rui Pedro Soares foi chamado a uma comissão composta por representantes eleitos da nação que pretendiam extrair um julgamento político de certos acontecimentos de que ele tinha sido um ator-chave. Sendo o julgamento político, a CPI não se destinava a punir nem a castigar. Acresce ainda que, com razão ou sem ela, a CPI se auto-limitou na utilização de certos meios de prova (as célebres escutas). Lá chegado, Rui Pedro Soares decidiu não falar, tal como noutra comissão tinha decidido falar durante largos minutos sobre futebol e outros assuntos que ocuparam desnecessariamente tempo precioso. Toda a gente achou que ele estava no seu direito e não lhe aconteceu nada por isso.
As diferenças estão claras. Deveríamos estar todos satisfeitos por uma CPI não ser como a inquisição, a começar por Rui Pedro Soares. Em troca, ele deveria poupar este povo cansado à exibição da sua pesporrente ignorância.
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