Daniel Sampaio, Pública 10/4/2011
"Em Portugal, a sala de aula está fechada", aqui está uma importante constatação de Andreas Schleicher, coordenador do Programme for International Assessment (PISA), o maior estudo internacional sobre as competências dos alunos de 15 anos. Os dados de 2010 revelaram, como foi noticiado, algumas melhorias nos estudantes portugueses.
Na entrevista a um semanário, Schleicher considera importante continuar o progresso e salienta como é decisivo "investir em recursos capazes de ajudar os alunos com dificuldades (...), porque se pode ter sucesso com todas as crianças". Como estratégia possível, coloca a hipótese da retirada momentânea do aluno da sala de aula, com posterior reintegração após melhoria. Sobre a avaliação, Schleicher alerta para o facto de surgir associada à progressão da carreira, em vez de se ligar ao desenvolvimento profissional, ou seja, aos pontos fortes e fracos dos professores, no seu desempenho em diversos contextos. E conclui com a afirmação de que não sabemos se um professor está a fazer um excelente ou péssimo trabalho, porque "a sala de aula está fechada".
Esta entrevista deveria ser afixada nas escolas e merecer toda a atenção dos responsáveis educativos. Infelizmente, nada disso se passa. O mistério da sala de aula é uma realidade: mesmo em escolas bem organizadas, os factores individuais de alunos e professores podem impedir o normal funcionamento da classe, como acontece em casos de falta de autoridade dos docentes e de indisciplina dos jovens. Os alunos com problemas de aprendizagem são enviados para aulas de apoio sem uma verificação criteriosa das suas insuficiências. Nunca são estudados os factores de grupo que podem estar a impedir o progresso, nem são analisadas as dificuldades dos professores em transformar a sala de aula num grupo de trabalho cooperativo: os docentes descrevem as turmas como "boas" ou "más", esquecendo a heterogeneidade do conjunto e as diversas etapas de desenvolvimento em que se encontram os alunos. A indisciplina é, em muitos casos, impressionante: contou-me uma professora que só conseguia "sumariar" - estranho verbo para quem ensinava Português - porque as aulas eram passadas a mandar sentar os alunos e a gritar para que estivessem calados. Outra colega tinha abandonado a sala de aula porque os alunos, "transformados" em gatos, "miavam" a compasso, enquanto dois deles gritavam que o director de turma era um "ganda boi". E a escola prosseguia o seu quotidiano, sem que alguém se preocupasse com a sala de aula, que permanecia "fechada".
Tudo isto se passa num país em crise, em vésperas de eleições. Num território em que um partido procura culpar o outro e o Presidente da República não foi, até agora, capaz de assegurar um acordo pré-eleitoral para um governo estável. A Assembleia da República, depois de impedir a diminuição do número de disciplinas - uma medida saudável, embora mal justificada -, tomou a decisão de parar o sistema de avaliação dos professores, obtido por acordo com os sindicatos e em vigor neste ano lectivo. O bom senso aconselharia uma revisão cuidada do que se obteve e do que não se conseguiu, de modo a que o novo governo e no próximo ano lectivo fizesse as alterações necessárias ao sistema em vigor. Prevaleceu a pressa e o espectáculo político: a verdade é que alguns partidos ganharam e a escola perdeu tempo.
A sala de aula ficará aberta quando for avaliada por alguém exterior à escola. A escola problemática melhorará quando abrir as portas ao trabalho na comunidade e for dirigida por um director competente: alguém cujo curriculum ateste capacidade de melhorar os resultados e conseguir satisfação de docentes e discentes noutro estabelecimento de ensino definido como difícil.
Neste link há um texto de uma conferência que Schleicher deu no Conselho Nacional de Educação:
http://www.cnedu.pt/images/andreas.pdf
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