28 abril, 2011

Sócrates denunciado por eventual administração danosa por dar tolerância de ponto


O advogado Alfredo Castanheira Neves apresentou na terça-feira ao Ministério Público uma denúncia visando o primeiro-ministro, por eventual administração danosa, resultante da tolerância de ponto concedida à função pública na tarde de quinta-feira santa.


16 abril, 2011

Os Lusíadas em nova versão


I

As sarnas de barões todos inchados
Eleitos pela plebe lusitana
Que agora se encontram instalados
Fazendo aquilo que lhes dá na real gana
Nos seus poleiros bem engalanados,
Mais do que permite a decência humana,
Olvidam-se de quanto proclamaram
Em campanhas com que nos enganaram!

II

E também as jogadas habilidosas
Daqueles tais que foram dilatando
Contas bancárias ignominiosas,
Do Minho ao Algarve tudo devastando,
Guardam para si as coisas valiosas.
Desprezam quem de fome vai chorando!
Gritando levarei, se tiver arte,
Esta falta de vergonha a toda a parte!

III

Falem da crise grega todo o ano!
E das aflições que à Europa deram;
Calem-se aqueles que por engano
Votaram no refugo que elegeram!
Que a mim mete-me nojo o peito ufano
De crápulas que só enriqueceram
Com a prática de trafulhice tanta
Que'ainda andarem à solta, só me espanta.

IV

E vós, ninfas do Coura onde eu nado
Por quem sempre senti carinho ardente
Não me deixeis agora abandonado
E concedei engenho à minha mente,
De modo a que possa, convosco ao lado,
Desmascarar de forma eloquente
Aqueles que já têm no seu gene
A besta horrível do poder perene!

12 abril, 2011

Puseram alguma coisa na água?


José Vítor Malheiros, Público

O PS é uma família e não renega os seus filhos. Mesmo que Sócrates destrua o país, o partido vai continuar a gostar dele.

Apesar da imensa cobertura mediática do congresso do PS deste fim-de-semana, os media não contaram a história essencial. Refiro-me à mudança de nome do PS, que abandona a designação de Partido Socialista e passa agora a adoptar oficialmente a designação pela qual já era informalmente conhecido: Partido de Sócrates. A alteração tem o inconveniente de manter a mesma sigla, mas a designação alternativa Partido do Zé, defendida com o habitual brilho intelectual por António Vitorino, não colheu o apoio dos congressistas. O que importa é que, depois deste congresso, ficou mais clara a identidade do PS e mais bem definida a sua visão para o país.

O congresso teve momentos muito diversos e oscilou entre o ambiente de seita acossada cerrando fileiras ("Eles estão todos contra nós, mas "há-des" ver") e um tom bajulatório de exaltação caudilhista com longa tradição política. E houve um perfume retro muito bem conseguido pela produção. Só se lamenta que o Don"t cry for me Portugal que tinha sido especialmente gravado por Madonna não tenha chegado a ser exibido.

Sintomática do ambiente foi a intervenção de Jaime Gama, que, apesar de, na substância, ter posto os pontos nos ii quanto às responsabilidades do Governo e do primeiro-ministro na negociação do empréstimo à UE e FMI (Gama tem alguma sensatez), seguiu na forma o mesmo tom laudatório do líder ("os ombros de José Sócrates" devem aceitar mais esta "dificuldade", disse Gama). Podia ver-se a cruz a ser arrastada pela Via-Sacra.

Já sabíamos que no PS de Sócrates as críticas e as dissidências eram malquistas e se pagavam caro. Agora sabemos que o unanimismo foi assumido pelo partido como um valor nuclear. A justificação é o acosso da esquerda e da direita, mas os estalinistas também não tinham falta de argumentos para defender o encobrimento e a participação nos crimes do regime. Não há muitas ideias políticas mais suspeitas do que este "sigamos com uma obediência cega e num silêncio servil o nosso líder autocrático porque estamos cercados", mas foi esse o moto que o PS decidiu escolher. Tal como preferiu o deleite autocomplacente (Ana Gomes foi uma das raras excepções) ao mínimo olhar crítico sobre a realidade.

É verdade que houve intervenções que abordaram a crise política, financeira e social portuguesa, tendo apresentado aos congressistas presentes um leque de propostas estratégicas para enfrentar os problemas da nação. Só que o leque foi desde um "Zé, pá... eles querem porrada mas eles mal sabem como nós somos danados para a porrada... e então tu, caraças, pá, Zé!" até "Tu, Zé, nem sabes o orgulho que eu, caraças, tenho de estar ao teu lado, pá". Sócrates, como não podia deixar de ser, emocionou-se.

Pode dizer-se que tudo isto é compreensível. Que isto mais não é que lealdade, camaradagem, amizade, valores importantes (uma das músicas de fundo do vídeo exibido foi That"s what friends are for), mas o que o PS parece não perceber é que há valores que um partido tem de prezar mais que esses, como a honestidade, a justiça ou o bem-estar dos portugueses. Que os amigos de Sócrates lhe dêem palmadas nas costas é normal. Que o partido o reeleja para o colocar de novo à frente do Governo é irresponsável. E que o PS se compraza em ser o partido dos amigos é preocupante. Não é que os outros não sejam, mas têm um bocadito de vergonha. Ninguém pensou que seria melhor o PS apresentar-se como o partido das ideias para Portugal do que como o partido da lealdade ao chefe?

Uma das explicações para este congresso alegremente mentecapto e de glorificação do líder é, simplesmente, que alguém tenha posto alguma coisa na água. Outra explicação possível é que o PS seja só isto.

Homens da luta na moção de recandidatura de José Sócrates




10 abril, 2011

A sala de aula está fechada


Daniel Sampaio, Pública 10/4/2011


"Em Portugal, a sala de aula está fechada", aqui está uma importante constatação de Andreas Schleicher, coordenador do Programme for International Assessment (PISA), o maior estudo internacional sobre as competências dos alunos de 15 anos. Os dados de 2010 revelaram, como foi noticiado, algumas melhorias nos estudantes portugueses.

Na entrevista a um semanário, Schleicher considera importante continuar o progresso e salienta como é decisivo "investir em recursos capazes de ajudar os alunos com dificuldades (...), porque se pode ter sucesso com todas as crianças". Como estratégia possível, coloca a hipótese da retirada momentânea do aluno da sala de aula, com posterior reintegração após melhoria. Sobre a avaliação, Schleicher alerta para o facto de surgir associada à progressão da carreira, em vez de se ligar ao desenvolvimento profissional, ou seja, aos pontos fortes e fracos dos professores, no seu desempenho em diversos contextos. E conclui com a afirmação de que não sabemos se um professor está a fazer um excelente ou péssimo trabalho, porque "a sala de aula está fechada".

Esta entrevista deveria ser afixada nas escolas e merecer toda a atenção dos responsáveis educativos. Infelizmente, nada disso se passa. O mistério da sala de aula é uma realidade: mesmo em escolas bem organizadas, os factores individuais de alunos e professores podem impedir o normal funcionamento da classe, como acontece em casos de falta de autoridade dos docentes e de indisciplina dos jovens. Os alunos com problemas de aprendizagem são enviados para aulas de apoio sem uma verificação criteriosa das suas insuficiências. Nunca são estudados os factores de grupo que podem estar a impedir o progresso, nem são analisadas as dificuldades dos professores em transformar a sala de aula num grupo de trabalho cooperativo: os docentes descrevem as turmas como "boas" ou "más", esquecendo a heterogeneidade do conjunto e as diversas etapas de desenvolvimento em que se encontram os alunos. A indisciplina é, em muitos casos, impressionante: contou-me uma professora que só conseguia "sumariar" - estranho verbo para quem ensinava Português - porque as aulas eram passadas a mandar sentar os alunos e a gritar para que estivessem calados. Outra colega tinha abandonado a sala de aula porque os alunos, "transformados" em gatos, "miavam" a compasso, enquanto dois deles gritavam que o director de turma era um "ganda boi". E a escola prosseguia o seu quotidiano, sem que alguém se preocupasse com a sala de aula, que permanecia "fechada".

Tudo isto se passa num país em crise, em vésperas de eleições. Num território em que um partido procura culpar o outro e o Presidente da República não foi, até agora, capaz de assegurar um acordo pré-eleitoral para um governo estável. A Assembleia da República, depois de impedir a diminuição do número de disciplinas - uma medida saudável, embora mal justificada -, tomou a decisão de parar o sistema de avaliação dos professores, obtido por acordo com os sindicatos e em vigor neste ano lectivo. O bom senso aconselharia uma revisão cuidada do que se obteve e do que não se conseguiu, de modo a que o novo governo e no próximo ano lectivo fizesse as alterações necessárias ao sistema em vigor. Prevaleceu a pressa e o espectáculo político: a verdade é que alguns partidos ganharam e a escola perdeu tempo.

A sala de aula ficará aberta quando for avaliada por alguém exterior à escola. A escola problemática melhorará quando abrir as portas ao trabalho na comunidade e for dirigida por um director competente: alguém cujo curriculum ateste capacidade de melhorar os resultados e conseguir satisfação de docentes e discentes noutro estabelecimento de ensino definido como difícil.


Neste link há um texto de uma conferência que Schleicher deu no Conselho Nacional de Educação:

http://www.cnedu.pt/images/andreas.pdf



09 abril, 2011

Jardim, a grande fraude


A Editorial Caminho foi forçada a adiar a apresentação no Funchal do livro "Jardim, A Grande Fraude - uma radiografia da Madeira".

Porque será?

Tudo inocentes?

Vasco Pulido Valente, Público

Sócrates começou por jurar que não governaria Portugal com o FMI: porque "a agenda" do FMI implicaria uma "factura" pesada durante anos. Depois perguntou histericamente aos portugueses se queriam um governo com FMI ou sem FMI. E, uma vez posto em minoria na Assembleia, declarou que não tinha os poderes para negociar com o FMI, para anteontem com um prelúdio muito comovedor sobre "patriotismo", a cargo de Francisco Assis, pedir ajuda ao sobredito FMI. Mas não nos deu a confiança de esclarecer que espécie de "ajuda": se uma ajuda "intercalar" (que aparentemente não existe), se uma ajuda "mínima" (como quer Passos Coelho), ou se um "resgate" por inteiro, com as consequências do costume. O retrato do primeiro-ministro está todo neste deprimente espectáculo.

Só que o mais deprimente destes meses de Março e Abril não foi, como devia ser, o eng. Sócrates - foi a irrupção de génios pela televisão e pela imprensa que já sabiam a história inteira e se preparam agora para explicar por que razão o FMI era preciso (e, para a maior parte, ele era preciso há muito tempo) e o que pouco a pouco nos trouxera a este trágico sarilho. Com o seu arzinho presunçoso e professoral, economistas, financeiros, banqueiros, filósofos e arraia-miúda vieram revelar ao indígena atónito que nada, ou quase nada, se fizera de lógico e sensato de 1990-95 para cá. Não vale a pena repetir a ladainha. Ninguém duvida que o nosso enormíssimo buraco não se cavou num dia. Infelizmente, esta constatação pede uma pergunta óbvia: em que se ocupavam os sábios que hoje com tanto gosto nos predicam, enquanto os partidos (o PS e o PSD) arruinavam o país?

A ortodoxia em moda apela a que não se procurem "culpados". Mas, se, de facto, não se procurarem "culpados", para quem fica a culpa do tristíssimo fracasso do Portugal democrático? Para a má vontade de um Deus perverso? Para o destino? Ou para a insuficiência atávica do indígena? Era bom apurar isto, porque, se alguma destas três possibilidades (principalmente a última) ofende a delicadeza nacional, a única saída que nos resta é aceitar a ecuménica loucura dos portugueses. Quem se deixa chegar onde chegámos, levado por três dúzias de políticos, sempre reeleitos e até, às vezes, respeitados, não merece outro nome. E, pior ainda, quem desiste da verdade acaba inevitavelmente por desistir de si próprio.


Ministro sueco das Finanças: Governo português é responsável pela situação do país


O Governo português “tem uma grande responsabilidade” pela situação económica e financeira do país e colocou os parceiros europeus numa situação muito difícil por terem de decidir um programa de ajuda muito rapidamente e em condições tão complicadas, acusou o ministro sueco das Finanças, Anders Borg.

03 abril, 2011

Mais um velhaco


O administrador dos CTT Marcos Batista “não é licenciado, faltando várias cadeiras para terminar o curso”, confirmou o vice-presidente do Instituto Superior de Economia e Gestão (ISEG) com a tutela dos assuntos académicos. Silva Ribeiro disse ainda que “a pessoa em causa não chegou a concluir cadeiras que lhe dariam equivalência à licenciatura no formato pós-Bolonha”.
O ISEG está a ponderar entregar o caso ao Ministério Público, alegando falsas declarações prestadas pelo administrador dos CTT Marcos Batista. Ao contrário do que é afirmado pelo administrador da empresa pública, Batista não entrou em contacto com os serviços académicos da instituição de ensino para obter informações sobre a conclusão da licenciatura.


O administrador dos CTT Marcos Batista, ex-sócio do secretário de Estado Paulo Campos e por este nomeado, suspendeu ontem o mandato depois de ser questionado pelo jornal i sobre as suas qualificações académicas. Marcos Batista terá adulterado as habilitações académicas, afirmando ser licenciado pelo Instituto Superior de Economia e Gestão, como consta no despacho de nomeação publicado em Diário da República. O curso, porém, não foi concluído, apurou o jornal i junto dos serviços daquela instituição de ensino, não tendo Marcos Batista completado as cadeiras suficientes para concluir uma licenciatura pós-Bolonha.


Retrato de um chefe


Vasco Pulido Valente, Público


O dr. Passos Coelho resolveu pôr na rua o governo de Sócrates. Não sem provocação. Mas toda a gente esperava que ele tivesse alguma coisa dentro da cabeça e a comunicasse ao país. Não comunicou nada. O que ele fez foi começar uma sucessão de gafes que revelam uma inquietante tendência para aumentar em quantidade e qualidade. Começou por ir a Bruxelas declarar que, em caso de aperto, não hesitaria em subir o IVA. Esta inesperada franqueza provocou, como é óbvio, um grande embaraço ao PSD e o habitual chorrilho de trapalhadas (apoios, desmentidos, desculpas) que inevitavelmente deixaram o país mais perplexo do que estava. Aliviando a sua pessoa de meia dúzia de asneiras sobre o IVA e o IRS (de resto, desnecessárias), Passos Coelho não pareceu perturbado e passou a tarefas de outra natureza.

A primeira consistiu em entregar à FENPROF a avaliação dos professores que tinha levado uma eternidade a negociar e acabara numa meia derrota. Não sei quantos votos o PSD ganhou com esta espécie de exercício eleitoral, mas ganhasse os que ganhasse, a operação foi sórdida. Veio a seguir a sugestão para privatizar a CGD e a confissão (que ninguém lhe pedira) de que estava disposto a governar com o FMI. No meio disto, prometia também um programa para Abril, fabricado (ou dirigido) pelo dr. Catroga. E, para ir abrindo o apetite à populaça, aprovou por unanimidade no PSD um documento em que definia "pilares" ("pilares"?) num calão indigno do 12.º ano, que não houve português que percebesse ou levasse a sério. De qualquer maneira, a unanimidade agradou a Passos Coelho, que desde pequeno não gosta de conflitos.

Esta propensão para a concórdia universal é especialmente visível no partido, a quem ele jurou não aprovar uma aliança pré-eleitoral com o CDS. Para as luminárias lá de casa, esse acto de loucura custaria ao PSD, pelo menos, 21 deputados. Com essas preciosas criaturas talvez custe a maioria (absoluta) ao centro-direita e uma instabilidade permanente ao país. Não importa. Passos Coelho não quer zaragatas. Os jornais garantem que ele até nem tenciona excluir das listas nenhuma das facções que, depois de Marques Mendes, tornaram o PSD num objecto de irrisão e desprezo; e se prepara mesmo para convidar "independentes" (um género zoológico muito comum em épocas de eleições). Passos Coelho nunca diz "não". Consta mesmo que desistiu de exigir uma auditoria às contas públicas portuguesas, porque o Presidente da República e o Presidente da Comissão Europeia não achavam bem. Portugal que vote na ignorância do enorme sarilho em que o meteram. "Sim, dr. Cavaco!", "Sim, dr. Barroso!". Pedro Passos Coelho é um chefe.